sábado, 6 de fevereiro de 2010

O amigo virtual




Eu sei que ninguém gosta de ler textos longos no computador. Eu, particularmente, só leio se tiver a esperança de que o texto tem um conteúdo interessante. Então, eu peço que você, Leitor Fiel (como diria Stephen King), se apegue à esperança de que o que vem por aí é um texto divertido e gostoso de ler, apesar de longo. Boa leitura, e se não aguentar ler de uma vez só pare e continue depois, hehe. Até a vista.

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Ele havia dito que estaria do lado de fora da igreja quando a missa terminasse. Havia dito isso para ela através do computador, pelo bate-papo.
Seria o primeiro encontro deles. Ela nunca o havia visto antes, mas ele já a vira pelas fotos da Internet. Engraçado como ela não pedira para ver fotos dele nessas três semanas em que se conheciam pelo bate-papo. A conversa entre eles era tão agradável que esse detalhe acabava lhe escapando. Na verdade, ela até chegava a lembrar, mas à medida que o papo se desenrolava a coisa saía da sua cabeça. Uma coisa tinha que admitir: a conversa dele era bem charmosa.
Ela nunca ficava entediada ao teclar com ele; ria muito – às vezes quase ao ponto de gargalhar – e fazia muitas brincadeiras. Ele parecia uma pessoa engraçada e divertida, com muitas tiradas irônicas. Isso era bom, aumentava o interesse e deixava as coisas mais descontraídas. Parecia ser inteligente e perspicaz. Conseguia ler nas entrelinhas do que se escrevia, obtendo conclusões muito acertadas. Além disso, em muitas ocasiões lhe dera explicações coerentes sobre determinados assuntos.
Há coisa de uma semana, eles vinham combinando de se encontrar para o “cara a cara”. Como ela de vez em quando ia à missa numa igreja perto da casa dele, parecia ideal se conhecerem em tal ocasião. Ela não estaria sozinha, então não havia o risco de acontecer alguma coisa desagradável caso ele não fosse quem dizia que fosse. Ela sinceramente não acreditava que ele fosse algum bandido mentindo e se disfarçando de rapaz gentil e bacana. Ele lhe fornecera dados e detalhes muito plausíveis sobre sua vida, coisas que não poderiam simplesmente sair de uma mente criminosa. As informações pareciam fragmentos da vida de uma pessoa real, com uma rotina real e problemas reais. Nenhum bandido teria imaginação – nem disposição – para criar algo desse tipo.
Ele era uma pessoa de verdade que, pelo visto, havia contado uma mentira. Não havia ninguém do lado de fora da igreja com as características físicas que ele lhe dera. Alto, magro, ligeiramente musculoso, pele morena. Minha cor preferida é azul, então me espere ver vestido com uma camisa azul, ele dissera. Ninguém se encaixava na descrição. Ela passara a missa toda pensando nesse momento, não com uma ansiedade descontrolada, mas com ligeiro interesse e curiosidade. Agora, onde estava ele?
Havia muitas senhoras idosas e outras a caminho da terceira idade conversando, crianças alvoroçadas correndo de um lado para o outro e uma gente andando apressada para algum lugar ao lado da entrada principal da igreja. Bom, na opinião dela pareciam apressadas. Um grupo de cinco ou seis jovens, talvez sete porque ela estava com preguiça de contar, estava conversando mais à esquerda. Alguns deles carregavam bíblias debaixo do braço. De vez em quando uma risada mais alta irrompia de um dos rapazes. Nenhum deles se enquadrava na descrição do seu amigo virtual e, a despeito de um ou dois olhares, nenhum parecia ter interesse especial por ela.
Começou a se impacientar. Onde estava aquele tratante? Sua mãe e seu pai conversavam com alguns conhecidos, mas logo iriam embora. E quando se encaminhassem pro carro, ela não poderia simplesmente pará-los e pedir para esperar alguém que conhecia da Internet. Achariam que ela estava doida. Ou falariam para marcar encontro em outro dia. Isso se fossem os pais da sua imaginação, porque ela nunca pediria algo desse tipo num mundo real. A cara com que seu pai a olharia faria com que tivesse vontade de fugir para o carro e ficar lá por uma semana. Seu plano era se aproximar do seu amigo virtual e começar a conversar normalmente como se fossem velhos conhecidos. Seus pais pensariam que ele era mesmo um velho conhecido. Todo mundo ficaria feliz assim.
Espiou as horas no relógio vermelho que estava em seu pulso esquerdo. Cinco minutos haviam se passado desde que olhara pela última vez. Os grupos começavam a se dissipar, com seus componentes, um a um, indo embora. Nem os jovens que conversavam animadamente continuavam por ali. Haviam ido lanchar em alguma lanchonete nas redondezas, pelo que ela pudera entender. Talvez lá encontrassem um rapaz alto, magro, de camisa azul, rindo a valer por ter deixado uma idiota aguardando-o na saída da igreja. Ele estaria se empanturrando com um hambúrguer bem gorduroso e bebendo um refrigerante cheio de gás. Sim, essa era a dieta dos mentirosos.
Tudo bem, tudo bem. Se ele a queria fazer de boba criando uma falsa expectativa, ela não mais daria bola para ele no bate-papo. Simples, rápido e fácil, como diziam em algum comercial. Seus pais terminaram a conversa e se despediram dos conhecidos. A essa altura, eles eram os únicos à frente da igreja. Ela tomou a frente quando começaram a andar para o carro. Estava um tanto contrariada, mas também tranqüila. Ele não poderia alegar que ela não havia esperado tempo suficiente e também que ela tivera pouco interesse em se conhecerem. Seria mentira e ela teria como rebater. Entrou no banco detrás do carro e afundou no macio assento. Partiram logo depois.
Dez minutos depois que o carro já havia ido embora, uma bicicleta ofegante apareceu. Trazia um rapaz magro, alto, de camisa azul que estava maldizendo todos os parentes folgados da face da terra. Maldita tia Joana! Por que tinha que aparecer lá em casa logo hoje para pedir ajuda?!

Um comentário:

Maykendell disse...

Nossa, amei esse teu post, acho bem legal a pessoa expor o que pensa, ou então só colocar por colocar mesmo! Gosto bastante de ler e o que você postou foi muuuuuuuito interessante, te juro que enquanto lia, eu havia imaginado a garota esperando, acho que é porquê me pareço muito com essa garota, acredito bastante em amizades virtuais rsrsrs, verdade mesmo, acho que a amizade existe em várias áreas e como sou um pouco tímida tenho um pouco de receio em aparecer na vida real pra ver alguém! AMEEEEEEI *--*